Mayco Geretti
Agência BOM DIA
Beber uma cervejinha no final do expediente já se tornou cultural e certamente você tem no seu ciclo de amizades desde aquela pessoa que bebe dois copos e fica “alegre”, até aquele amigo que se gaba de tomar garrafas sem perder o tom. O caso é que o brasileiro bebe muito além do que deveria.
Em razão do álcool ser uma droga, não existe uma quantidade ideal a ser ingerida, mas a OMS (Organização Mundial da Saúde) procura estipular um valor de tolerância. Para a Organização, qualquer valor acima de 60 gramas de álcool consumido por semana – o equivalente a 4,2 latinhas de cerveja – é abusivo. Cada brasileiro está bebendo em média, segundo a Organização, 1.057 latinhas ao ano (2,8 ao dia), o equivalente a 18,5 litros de álcool puro.
Segundo o Comad (Conselho Municipal sobre Drogas) de Sorocaba, a estimativa é de que cerca de 10% da população local – algo em torno de 60 mil pessoas – tenha algum tipo de problema em lidar com a bebida. “Nem todas são alcoólicas que abandonaram tudo pela bebida. Esse montante é formado por aquelas pessoas que colocaram o álcool como parte de sua rotina e, se perguntadas, provavelmente não se incluirão no grupo que corre risco de dependência”, afirma a presidente do Comad, Maria Clara Schnaidman Suarez.
A psiquiatra afirma que o hábito de beber é o estopim da dependência: “Começa com o costume de beber uma cervejinha no almoço. Aquilo se torna um ritual e logo o dependente já não consegue comer se não tiver a cerveja”.
Tratamento
Uma vez que o alcoólico aceita sua condição, é hora de buscar tratamento. A principal frente de combate ao problema no sistema municipal de saúde são os Caps (Centro de Atenção Psicossocial), nos quais o doente é tratado por uma equipe formada por psicólogos, assistentes sociais e médicos. A metodologia empregada por Sorocaba segue a orientação do Ministério da Saúde, que preconiza o tratamento do alcoólico sem internação. “Precisamos fornecer ao dependente ferramentas que possibilitem o enfrentamento. O bar continuará do lado da sua casa. Se o trancarmos, é lógico que ele se afastará da bebida, mas a chance dele recair ao voltar para seu lar é potencializada”, explica Maria Clara.
Atualmente, cerca de 30% das pessoas que chegam aos Caps conseguem sucesso na superação do vício. O encaminhamento pode ser espontâneo ou através das unidades básicas de saúde. O atendimento é feito em duas frentes: No Caps AD Jovem são atendidas pessoas de até 29 anos e no Caps AD Adulto aqueles com mais de 30.
O perfil da dependência varia em razão da idade. Enquanto no Caps Jovem existem cerca de 1,2 mil cadastrados e cerca de 30% são tratados da dependência de álcool (maconha, crack e outras drogas mais pesadas representam a maioria dos atendimentos), no Caps Adulto, alcoólicos representam 70% dos assistidos. “O vício em álcool é algo presente mais assiduamente nos mais velhos. Por ser uma droga que deteriora o usuário lentamente, os dependentes tendem a conviver com o vício por décadas.”
Como identificar
Como descobrir se você – ou alguém próximo – tem algum problema com a bebida? Apenas um “sim” às perguntas abaixo sugere um possível problema. Procure o serviço de saúde mais próximo para discutir suas respostas.
• Você já sentiu que deveria diminuir a bebida?
• Você já se irritou com alguém que criticou sua relação com a bebida?
• Você já se sentiu mal ou culpado a respeito de sua bebida?
• Você já tomou bebida alcóolica pela manhã para “aquecer” os nervos ou para se livrar de uma ressaca?
Beber para acordar, beber para ficar em pé
Você já deixou de lado uma obrigação ou mesmo um prazer para dedicar esse tempo à bebida? É nesse momento em que, segundo especialistas, a dependência começa a mostrar sua face, normalmente de forma mais visível às pessoas que cercam o doente do que a ele mesmo.
Jaime, 42 anos, conheceu o álcool nas reuniões familiares. Incentivado pelos tios, tomou cerveja, mas jamais passou de um consumidor esporádico, daqueles que tomam algumas latas aos fins de semana. Com a vida adulta, veio o trabalho como motorista e o hábito de tomar um copo de cachaça de manhã, “para espantar o frio”. Aos poucos a aguardente já estava presente no almoço e do balcão do bar ganhou a despensa de sua casa.
“Para mim era algo que eu tinha controle. Estava tomando porque era um gosto, um prazer que eu estava me proporcionando, e não porque precisava. Quando eu comecei a enforcar trabalho para poder ficar bebendo é que consegui ver que estava fugindo do meu controle”, afirma. “Nessa época eu precisava beber para acordar, beber para ficar em pé”, conta o hoje mecânico, que afirma ter períodos de até seis meses de abstinência, sempre encerrados por recaídas que podem ter em sua origem episódios dos mais variados. “Já recaí porque recebi uma notícia muito boa e já tive recaída quando estava no buraco. Parece que a mente fica tramando para que eu mesmo me dê uma desculpa que justifique o fato de beber”.
A dona-de-casa Nilza, 32, buscou na bebida uma companheira, literalmente. As tardes de faxina em sua casa eram sempre regadas a conhaque, algo que lhe ajudava a amenizar a solidão causada pelas sucessivas viagens do marido, representante comercial. “O álcool, que no começo parecia entorpecer minha dor e diminuir aquela sensação de vazio, foi o mesmo que me escravizou. Só quando eu decidi que a bebida não seria mais uma muleta para encarar a vida é que comecei a dar a volta por cima.”
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